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18 de fevereiro de 2014

Contrapartidas dos submarinos: Justiça ao fundo. 

A sentença do processo das contrapartidas dos submarinos não surpreendeu quem acompanha o caso. De facto, já esperava um desfecho como este, ‘típico’ das investigações de corrupçāo de alto nivel em Portugal: o colectivo de juízes ilibou todos os dez arguidos — três alemães e sete portugueses.

É um veredicto vergonhoso para a Justiça e desesperante para os portugueses. Mostra como a partir de certa altura na fase da investigação judicial, tudo concorreu para conduzir a este mesmo resultado: a impunidade.

Não pude ainda ler a sentença, mas a imprensa diz que os juízes não encontraram prova de “ardil ou encenação engenhosa” no contrato das contrapartidas para que pudessem sequer configurar crime de burla ao Estado. Justificaram-no por não considerarem a perícia pedida pelo Ministério Público a uma empresa, entendendo que não cumpria requisitos de imparcialidade.

Mas tanto quanto se sabe, o colectivo de juízes não nega, realmente, que tenha havido prática de crimes. Só que os juízes decidem pela absolvição dos acusados com base nos vícios e ilegalidades que acharam haver no processo, relativos ao modo como a prova foi obtida pelo MP.

Acho que ninguém minimamente informado duvida de que houve corrupção e grossa burla e fraude cometidas contra o Estado: basta ler o contrato das contrapartidas e a forma obscena como despreza os próprios interesses do Estado; basta ver as taxas de (in)execução das contrapartidas (e se tivessem sido executadas 52% delas, valoradas em 632 milhões de euros, eram para ser investidas nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, viabilizando-os ...); basta olhar para a renegociação do contrato em 2012, já por este Governo e a Ferrostaal, no valor de cerca de 800 milhões de euros, que ia passar por recuperar um hotel de luxo no Algarve e, um ano depois…nem sequer isso ainda está de pé!

Desta sentença retira-se a conclusão de que o MP, apesar de ter operadores com profissionalismo, integridade e vontade de defender a legalidade e a justica, está dependente de orientações que podem reflectir manipulações políticas, além de incapacitado por falta de recursos, humanos e financeiros, falta de especialização e perícia para prosseguir independentemente investigações respondendo a casos de corrupção de grande complexidade e envolvendo decisores políticos. Assim se explica a rotatividade recorrente das equipas titulares da investigação. Não é apenas para demorar o processo: a possibilidade de serem cometidos erros aumenta.

Para além da absolvição, considero particularmente alarmantes as considerações dos juízes que este processo seria “desnecessário e até desproporcional" podendo ter sido resolvido através da arbitragem ou de renegociação. É incompreensível que um tribunal aponte para a desnecessidade da justiça estadual, como se se tratasse de meros diferendos contratuais. Como se não estivessem em causa actos criminosos da maior gravidade e um prejuízo colossal para o Estado, que o povo português está a pagar com língua de palmo! Como se não devesse ser apurada, também, a responsabilidade civil e criminal dos agentes do Estado - dos mais altos governantes aos mais baixos funcionários, civis e militares - que falharam, dolosamente, por negligência ou por incompetência, no acautelamento dos interesses públicos, quer na negociação, quer na execução do contrato.

Este processo das contrapartidas chegou a tribunal mas tem muito em comum com o que lhe deu origem: o referente ao contrato da compra dos submarinos. Nesse, tudo parece estar a ser feito para que nunca sequer chegue a tribunal: a investigação leva já mais de sete anos e pode acabar em Abril próximo, com a prescrição da responsabilidade criminal. Um resultado talhado pela decisão do Procurador Geral da República Fernando Pinto Monteiro de processar disciplinarmente as duas Procuradoras que haviam iniciado a investigação e haviam mesmo conseguido fazer uma busca conjunta, com a Procuradoria alemã, aos escritórios da Ferrostaal em Essen , onde muita documentação foi apreendida. Desde então não têm aquecido o lugar os procuradores encarregues do processo de investigação, faltam recursos financeiros, informáticos, de tradução e outros para "seguir o rasto" dos proventos da corrupção ( lembro os desaguisados entre o PGR e a ministra da Justiça em 2011, sobre as razões por que a investigação marcava passo...).

Ora, com base na busca conjunta desencadeada pelas originais investigadoras portuguesas, um tribunal alemão, em Munique, teve já tempo para dar, em 2011, como provada a corrupção de agentes do Estado português determinantes para a compra dos submarinos, condenando por corrupção activa dois ex-gestores da Ferrostaal!

E actualmente corre em Munique o julgamento de um dos agentes da corrupção, o alemão que Durão Barroso tinha nomeado Consul Honorário de Portugal em Munique. Por cá, o MNE limitou-se a demiti-lo: o Sr. Jürgen Adolf nunca foi chamado à justiça, vive beatificamente no Algarve a investir milhões em imobiliario... Também nunca foram chamados a prestar quaisquer esclarecimentos pela PGR - e ainda menos pela Assembleia da República! - os dois principais responsáveis políticos pela decisão de comprar os submarinos ao consórcio alemão e de vincular o Estado português a contratos em que o interesse público está, no mínimo, grosseiramente mal acautelado: o então Primeiro Ministro Durão Barroso e o então Ministro da Defesa Nacional, Paulo Portas.

Enfim, na Alemanha há condenados por corrupção em Portugal e na Grécia na compra de submarinos.
Na Grécia, o ministro que assinou o contrato e recebeu luvas já está preso.
Em Portugal não há corruptos, não há corrupção. Só submarinos e a facturar milhões, em pequenas reparações, confiadas a empresas alemãs, pois claro, porque até as garantias também foram contra os interesses do Estado. Submarinas, afundadas, andam as responsabilidades de Barroso e de Portas. Submarina, afundada também, anda a Justiça!



NOTA: este é o texto em que me baseei para o meu comentário no "Conselho Superior" da ANTENA 1, esta manhã.

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